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Sexta-feira, 10 de Agosto de 2007

Baptista Bastos: "Esforço-me para que as pessoas gostem de mim"

 

Helena Teixeira da Silva

Está de férias no Ribatejo. Baptista Bastos, 73 anos, atende o telefone, disponível para responder à entrevista no imediato. Mas também aceita que possa ficar para o dia seguinte. O jornalista e escritor interrompe o livro de memórias durante 29 minutos. Alguém duvidará da razão pela qual é controverso? 

António Lobo Antunes só costuma conceder entrevistas a quem leu a obra dele completa. Também só fala com quem conhece o seu percurso jornalístico de 50 anos?

Não conheço o Lobo Antunes.

 

Quer dizer que ainda não fizeram as pazes?

Não sei quem é. Li só um livro dele.

 

O seu estilo de entrevistar é reconhecido. Qual é o par que mais respeita?

Na televisão, é o Mário Crespo.

 

E nos jornais?

É mais difícil, embora eu leia todos os jornais… mas deixe-me cá ver…

 

Anabela Mota Ribeiro?

Não, não… A entrevista para mim é outra coisa… É o Mário Crespo definitivamente que se aproxima mais da ideia que eu tenho de entrevista.

 

Por que desatou a perguntar a toda a gente onde havia estado no 25 de Abril?

Queria saber onde não estiveram. É uma data importantíssima. Costumo dizer que é a minha data do coração.

 

Data a que o tempo fez jus?  

Não. O 25 de Abril não foi cumplido. Foi traído pelo PS.

 

Alguma vez chegou a sentir a inveja de que o seu editor, n’”O Século”, Acúrcio Pereira, disse que iria padecer?

Ele era chefe de redacção; na altura ainda não havia editores. Editor, em Portugal, não quer dizer coisa rigorosamente nenhuma. É uma cedência do jornalismo português ao jornalismo anglo-saxónico. Eu comecei muito novo a trabalhar n’”Século”, que era, de facto, considerado uma universidade. O Mário Zambujal até lhe chama “catedral”, porque saíamos dali como profissionais muito apetrechados. E eu, como vinha de uma tradição literária, comecei a fazer jornalismo de autor, muito marcado, e foi nesse sentido que Acúrcio Pereira disse: “Eh, pá, vais sofrer invejas”. É uma coisa terrível. Mas eu não dou muita importância a essas coisas. Aliás, eu nunca me levei muito a sério. As pessoas que se tomam muito a sério são umas desgraçadas. Tomo a sério os outros.

 

Miguel Sousa Tavares disse, recentemente, o contrário: que se acha superior e que age como se o país estivesse sempre em dívida consigo...

O Miguel Sousa Tavares tem um problema gravíssimo: pensa e escreve como o Miguel Sousa Tavares.

 

O que quer isso dizer?

Quer dizer rigorosamente o que acabei de dizer. É um escritor que não existe e um jornalista que dá vontade de rir.

 

Diz e faz as coisas como lhe apetece. Qual é o preço?

Não podia fazer à maneira do Miguel Sousa Tavares, senão era uma maneira muito mal feita.

 

A integração dos jornais em grandes grupos económicos restringe a nossa liberdade?

Mas isso é resultado da globalização e do mercado livre, que permite tudo. Hoje, qualquer pessoa chega a director de jornal com uma rapidez impressionante, qualquer pessoa começa a escrever artigos de opinião. Não pode ser! Perde-se completamente a credibilidade. Se calhar sou anacrónico, penso de outra maneira, sou de outro tempo… Mas eu trabalhei em grandes jornais, e aquelas redacções metiam medo, porque cada um vigiava o outro. Era um jornalismo que recusava essa grande tese da distanciação; era um jornalismo da proximidade o que nós fazíamos. Aliás, não entendo essa coisa da distanciação quando a única coisa que o jornalismo pode ser é justo, procurar a justeza das coisas. Quanto mais aproximados estamos, mais entendemos os factos.

 

Quando fala de proximidade não está a referir-se a uma proximidade geográfica… Digo isto, porque os jornais têm investido em edições múltiplas, com destaques diferentes para cada região do país…

Não, não. Falo de aproximação no sentido do compromisso com o leitor. A tese da distanciação é como se o jornalista não tivesse nada a ver com a notícia, como se o director e o chefe de redacção não tivessem nada a ver com o jornalista, e o jornal não tivesse a ver com nada. A distanciação é absurda.

 

Os jornais estão a perder leitores. Acredita na inversão do cenário?

Os jornais vendem menos porque estão cada vez estão piores, não correspondem às necessidades e aspirações das pessoas, nem fornecem o retrato da sociedade portuguesa. Veja este caso exemplar: como é possível que durante 15 dias, as televisões, os jornais e as rádios tenham estado a massacrar-nos a cabeça com um problema de dois cavalheiros -  Paulo Teixeira Pinto e Jardim Gonçalves - cujo problema é pessoal? São pessoas, ao que julgo saber, que ganham mais de 50 milhões por ano. Joe Berardo, com aquela forma que lhe é própria disse esta coisa espantosa: “O Jardim tem 40 guarda-costas e aviões particulares”. O que é isto? Isto não pode ser. Aquilo é uma empresa privada, certo, mas as coisas têm que ter um mínimo de ética e moral. Os jornalistas não fizeram uma interpretação factual daqueles acontecimentos. Como vivem? Como educam os filhos? É importante saber isso. Eu tenho três filhos formados e vi-me à nora para os licenciar. Tive que abdicar de muitas coisas. Ninguém nos ajudou. Mas sim, sim, sim, há aí uma nova geração de jornalistas que está a perceber que não pode ser enganada. E isto vai dar frutos, evidentemente.

 

O futuro da imprensa passa pelos textos curtos ou bem escritos?

Sobretudo bem escritos. Não entrem nessa espécie de depressão que tem sido provocada por uns tipos medíocres que transformaram o jornalismo numa espécie de tabelionato. Há uma frase de um escritor que admiro muito: “Quem sabe faz, quem não sabe ensina”. Já viu o bando de medíocres que está nas escolas de Comunicação Social sem saber fazer uma notícia?

 

Os textos de necrologia deveriam regressar às páginas dos jornais?

É uma das notícias mais difíceis, mas o Miguel Sousa Tavares não percebe nada disso, julga que o jornalismo é outra coisa. Há grandes jornalistas que fizeram grandes necrologias. Basta ler o terceiro volume de “As farpas”, de Ramalho Ortigão para perceber o que é fazer uma necrologia.

 

Ser-lhe-ía mais apetecível escrever as suas memórias ou um manual de jornalismo?

Manuais, nem pensar. Dei aulas numa Universidade. Começaram com 21 alunos e acabaram com 40. Mas isso aconteceu porque eu levava livros do Sena, do Nemésio, do Eugénio de Andrade e discutia com eles. Estou há muito tempo a escrever um texto memorialistico. Não é que a minha vida tenha alguma importância, mas nela atravessou-se muita gente. Conheci meio mundo. Ainda ontem estive a terminar um texto sobre Aquilino Ribeiro. Eu conheci-o. Ele gostava muito de mim. Foi essa gente que formou o homem que eu sou. Gente que tinha o conceito da ética, da moral, da deontologia, e que a aplicava a todos os sistemas de vida.

 

Está na casa de Constância, no Ribatejo. O que faz aí?

Leio e escrevo no computador.

 

Tinha de si uma imagem mais romântica: a do homem que ainda escreve à mão...

Mas escrevo à mão. Num Moleskine onde aponto uma data de coisas e com uma Mont Blanc. Só depois passo para o computador.

 

Que relação tem com a internet? Vasculha blogs?

Não percebo nada disso, nem quero. Gosto do papel impresso, do cheiro dos jornais e das redacções. Aos blogs falta o suor, o cheiro dos corpos, a gritaria…

 

Ameaçou não votar nas eleições intercalares de Lisboa...

... e não votei. E disse ao António Costa, que conheço desde pequeno, que não iria votar nele, porque ele é cúmplice das malfeitorias que este Governo tem feito. É das coisas mais lamentáveis que tenho visto. Felizmente, não votei neles.

 

Critica a Esquerda por estar mais à direita que a Direita._Mas também não se revê na Direita. É um órfão político?

Sou um homem de Esquerda, irremediável e jubilosamente.

 

Mas não é deste PS?

Este PS não tem nada a ver com a Esquerda. Sou de uma Esquerda muito rebelde, que contesta as coisas, que leu Marx, mas que não recusa a bíblia. Que se encontra onde encontra o humanismo. Estamos a precisar de gostar uns dos outros.

 

Gosta que gostem de si ou basta-lhe que o respeitem?

Gosto muito que gostem de mim e faço grandes esforços para isso, sobretudo com as mulheres.

 

Porque razão diz que a vida só é bonita se for difícil?

Eu sou muito feliz. Não há nenhuma pessoa feliz, mas poucos homens estarão tão perto da felicidade como eu. Casei com uma mulher que me tem aguentado tudo, tenho a profissão que escolhi e é verdade, a vida só é bela quando é difícil. A gente só gosta das coisas que custam a adquirir. Tenho tantos amigos, que nem julgava que os tinha. Não tenho medo de dizer as coisas. Não gosto da mediocridade, da soberba, da arrogância. Não gosto daqueles jornalistas - e estou a pensar num em particular, e do qual já disse o nome - que querem ser os catões da moralidade quando na verdade tem telhados de vidro. As pessoas têm que ter com os outros uma relação de respeito e admiração. Eu admiro tanta gente que, às vezes, os meus amigos dizem: “Tu admiras demais”. Tenho um grupo que se reúne todas as sextas-feiras. Somos os “Empatados da vida”, aqueles que nem venceram, nem foram vencidos.

 

Quem são?

O Mário Zambujal, o João Paulo Guerra, o Eugénio Alves, o professor António Borges Coelho, o Fernando Dacosta e o José Manuel Saraiva. Não queira saber o que nós nos divertimos.

 

Gostava de ser uma mosquinha nessas tertúlias…

Posso convidá-la, se quiser. Às vezes, convidamos pessoas. O último foi o Luís Filipe Menezes.

 

A idade ainda é um posto?

A idade não, a amizade é que é um posto. Amigo nunca trai amigo.

 

Recentemente, morreram dois dos seus poetas de eleição: Mário Cesariny e Eugénio de Andrade. Lê-os agora de forma diferente?

Tenho uma colecção de poesia que, se calhar, muitos poetas não tem. A poesia ajudou-me a melhorar a prosa. A poesia e a pintura. Percebi isso muito cedo. Andei em arquitectura, e andei a chumbar, e percebi com Van Gogh e, mais tarde, em Leninegrado - continuo a dizer assim e não São Petersburgo -, no Museu Hermitage, com parte substancial da obra de Picasso, o que era o adjectivo na prosa, com cor, mas com contenção. Não é atirar adjectivos aos molhos como faz o Lobo Antunes.

 

Raul Brandão, um dos seus escritores, escreveu: “A verdade amarga e única é esta: é que na vida é preciso sonhar para não se morrer transido, tantos são os pontapés que a gente leva na alma e noutra parte”: Concorda com ele?

Ainda ontem estive a reler parte de “A Farsa”. É assim. Sou incapaz de pensar numa pessoa que não sonhe. Pode viver sem ideias, mas não pode viver sem sonhar. A vida seria insuportável

 

A sua vida é um acto poético?

Sempre foi; sempre será.

 

Vai continuar a resistir à gravata em prol do laço?

Paginei o “Diário popular” e a gravata, naquela tipografia tradicional, ficava sempre cheia de tinta. Passei a usar laço. O nó do laço é mais fácil de dar do que o da gravata. Sim, porque não os compro feitos.


publicado por JN às 03:25

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