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Domingo, 9 de Dezembro de 2007

Vicente Jorge Silva: "Gostaria de ser como Hemingway ou Camus"

 

“Começava a compreender que nada é mais inabitável do que um lugar onde se foi feliz”, escreveu Pavese e Vicente Jorge Silva, 61 anos, subscreve. Talvez por isso, podendo escolher, não voltaria ao Público, nem ao Expresso. Continua a pensar num projecto novo e, talvez por isso, mesmo não sendo sebastianista, todos esperam que um dia volte.

Já não é jornalista, nem político, nem exactamente cineasta. É o quê?

Peço desculpa por lembrar que continuo a ser jornalista. Foi por isso, aliás, que não me senti bem na pele de político. Apenas gostaria de cruzar mais vezes a paixão do jornalismo com a paixão do cinema.

O que está realmente mais próximo da intervenção cívica: a política ou o jornalismo?

Para mim, o jornalismo.

Se fosse o caso, escolhia voltar a ser director do Público ou refundar o Expresso? Nem uma coisa nem outra. Gostaria de lançar-me num projecto novo e diferente da imprensa que existe.

O Público que lançou em 99 ainda existe?

Obviamente, não.

O seu nome aparece quase sempre que há rumores de que vai surgir um novo jornal. Isso faz de si um D. Sebastião?

Nunca fui sebastianista.

Ver muitas vezes quadros da sua vida como se fosse um filme faz de si o quê?

O que sou.

Quando escreve a sua coluna no Sol, vai ver no dia seguinte se os outros jornais o citaram?

Não.

Aceitou escrever para aquele semanário por amizade ao director ou pela verdadeira pulsão da escrita?

Pelas duas razões. E também porque ganho a vida escrevendo nos jornais.

Há alguma revista de fim-de-semana, na imprensa portuguesa, que actualmente lhe encha as medidas?

Não.

Ainda gostava de ser o Antonioni português?

Nunca tive essa ridícula veleidade.

O que lhe doeu mais quando percebeu que o cineasta italiano tinha morrido (ou, se é possível quantificar o inquantificável, sofreu mais com Bergman)?

Antonioni e Bergman eram os meus realizadores mais queridos. Que tenham morrido no mesmo dia foi um duplo choque, um sinal de que toda uma idade de ouro do cinema passara à História.

A única longa-metragem que realizou, a ficção "Porto Santo", foi um caso quase unânime de péssimas críticas. Isso condicionou o seu futuro?

Claro que sim.

O filme foi lançado há 10 anos [8 de Agosto 1997]. Assinalou a data?

A data exacta, não.

Está agora a filmar "As ilhas desconhecidas", de Raul Brandão. O que mais o atrai no escritor?

Atrai-me a forma como combina um fortíssimo sentido trágico da vida com uma intensa exaltação dos sentidos e da natureza. Sem esquecer a sua fabulosa paleta de cores – é talvez o maior pintor da literatura portuguesa.

Escreve ele em "A morte do palhaço": "Da existência ficara-lhe o olhar desvairado para dentro, de quem segue na alma um sonho e anda na vida por acaso; o olhar daqueles em quem a vida interior é enorme e que ficam surpreendidos quando a dor lhes diz que o mundo existe". Poderia ser esta, também, a definição que faria de si? Não me reconheço nessa dimensão trágica, mas a frase exprime genialmente o abismo entre o sonho e a vida que Brandão persegue na sua obra.

Experimentar ser actor é uma ideia que o cativa exactamente porquê?

Talvez por causa do meu lado histriónico. O João Botelho deu-me agora a oportunidade de fazer um pequeníssimo papel na ‘Corte do Norte’, representando o meu trisavô que fotografou Sissi.

Foi nesse sentido que quis ser político: para fazer de conta que tinha poder?

Detesto o poder pelo poder. O poder, para mim, é puramente instrumental. Só serve para levarmos a cabo as coisas de que gostamos ou achamos úteis (para nós e eventualmente para os outros).

Alberto João Jardim não gosta de si. E você gosta dele?

É público e notório que não.

Continua válida esta célebre tirada que teve: "A Madeira de Salazar foi mais democrática do que é Madeira de Jardim"?

É preciso entendê-la no contexto da minha relação com a Madeira e do tempo em que foi possível fazer ali um jornal como o ‘Comércio do Funchal’. Hoje, a atmosfera política e social na Madeira é, para mim, mais asfixiante do que durante os últimos anos da ditadura.

Disse que só os governos de Cavaco resistiram às chantagens de Jardim. É altura de actualizar a afirmação?

Sim. Também se poderá dizer o mesmo em relação a Sócrates.

Escreveu esta pergunta há alguns meses no Sol: "Será que ao eucalipto Cavaco sucedeu agora o eucalipto Sócrates?". Já tem resposta?

A pergunta tinha já implícita uma resposta.

 

Acha que a José Sócrates aplica-se a frase "Só sei que nada sei"?

Só ele poderá responder.

Ainda valoriza mais o cartão de sócio do Marítimo do que o de militante do PS? Fui militante do PS apenas durante os dois anos e meio em que estive no Parlamento. E sou sócio do Marítimo há mais de cinquenta anos. Mas o mérito dessa fidelidade cabe sobretudo ao meu pai que é o sócio nº 1 do clube. O Marítimo de hoje já pouco ou nada tem a ver com o simpático e afectuoso clube de amadores pelo qual torcia fervorosamente na minha infância.

Na política continuam a ser mais os carneiros dos favores e dos dotes do que os outros? Infelizmente, sim. E, porventura, cada vez mais.

Precisaria de uma circunstância exacta para voltar à política? Não voltarei à actividade política.

Ser abstencionista e não sentir culpa é uma coisa que lhe veio com a idade?

Talvez seja uma forma de ‘sagesse’.

O desaparecimento de Maddie visto a partir da imprensa portuguesa dava um 'case study' porquê? Não apenas da imprensa portuguesa, mas do sistema mediático em geral. Porque nos mostra até que ponto esse sistema mergulhou numa espiral de desvario e como a sociedade absorve e estimula esses fenómenos de histeria.

E do lado dos media ingleses, cometem-se mais ou menos erros de ética? Muitos mais. A imprensa tablóide inglesa é verdadeiramente repugnante.

Independentemente de já não integrar a Comissão de Ética, o que o incomoda mais: jornalistas deputados; jornalistas assessores ou jornalistas adidos culturais? Toda a promiscuidade me incomoda. Quando fui deputado devolvi o meu cartão de jornalista, mas os órgãos da classe são condescendentes com essas situações.

Disse certa vez que era farfalhudo a escrever. Acha que adjectiva demais? Infelizmente, acho. Mas talvez seja tarde para reinventar o meu estilo. Gostaria de ser mais seco, como o Hemingway ou o Camus (dois grandes jornalistas).

Gostava de saber dançar maravilhosamente? Adoro dançar e dizem-me que não danço mal. Mas é claro que gostaria de dançar maravilhosamente. Lembro-me, por exemplo, do meu pai e da minha mãe a dançarem o tango. Faziam-me muito inveja.

As pessoas de bem não conduzem, fazem-se conduzir. É por isso que não tira a carta?

Não tenho nenhuma teoria sobre o assunto e não reivindico qualquer privilégio aristocrático. E agora é tarde de mais para aprender a conduzir.

Por que odeia arte contemporânea?

Adoro arte contemporânea e, entre os artistas portugueses vivos, admiro imenso Jorge Martins, Paula Rego, João Queirós, Lourdes de Castro ou Ilda Davide, por exemplo. Apenas detesto a impostura de alguma arte ‘conceptual’ e de certas ‘instalações’.

Também não gosta de Joe Berardo?

Joe Berardo é uma personagem de romance. Mas ele perdeu o sentido das proporções devido ao palco que lhe ofereceram.

"Começava a compreender que nada é mais inabitável do que um lugar onde se foi feliz": esta frase de Cesare Pavese ainda é a frase da sua vida?

Cada vez mais.  

 

 


publicado por JN às 04:27

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