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Sexta-feira, 17 de Agosto de 2007

Francisco Moita Flores: "PSD pode acabar do tamanho do Bloco de Esquerda"

 

 

Helena Teixeira da Silva

 

Gastou o dia apassear pelas feiras e romarias de Santarém. Francisco Moita Flores, 54 anos, escolheu viver ali; as pessoas escolheram ser conduzidas por ele. Só no fim dos seus deveres de autarca, atende o telefone. Escritor e  investigador responde em 29 minutos fazendo sempre a apologia da terra.

 

Já lhe aconteceu ver a sua vida no cinema?

Cenas da minha vida talvez, mas a minha vida não. Acontece-me ver policiais e pensar: isto já me aconteceu.

 

Que episódio da vida nacional gostaria de adaptar?

Há vários. Gostaria muito de fazer uma série sobre crianças desaparecidas.

 

Vai realizar em Setembro o primeiro festival de making-offs do mundo. De onde veio a ideia?

De um realizador amigo, Jorge Paixão da Costa. O Francisco Bravo Ferreira (produtor) deu-lhe corpo. No mundo há muitos festivais de cinema a mostrar o produto final e nenhum a mostrar as entranhas. Daí ter apadrinhado a ideia.

 

Santarém é o melhor palco para esse festival?

É o melhor palco do país para qualquer iniciativa de índole cultural, porque está perto de tudo. Só alguma distracção leva as pessoas a não perceberem isso. E as pessoas andam tão distraídas que até fizeram a ponte de Benavente para que as pessoas que vão do Norte para o Algarve passem o Tejo. É justamente para que essa distracção não continue que estamos a dar este impulso a Santarém, transformando-o num pólo cultural e turístico. Num ponto de encontro.

 

Do ponto de vista da receptividade do seu trabalho, pensa mais nos leitores ou nas audiências televisivas?

Os livros estão no livre arbítrio dos leitores. Daí ser muito saboroso saber que sou lido. O meu último livro, “A fúria das vinhas”, que saiu em Abril já vai na sétima edição. Do ponto de vista da televisão, o problema é saber que um tem que agradar a todos sem perder o sentido de dignidade da ficção. Preocupa-me esse equilíbrio, que não é fácil de conseguir, sobretudo porque é um jogo interno muito forte.

 

Os nus que aparecem nas suas séries são uma cedência para obter audiências ou uma inevitabilidade para ser fiel à história?

Escrevi duas séries hardcore muito perto uma da outra. Séries audazes – Ballet Rose e Capitão Roby – que tinham nus e sexo, e outras séries – João Semana, Ferreirinha – onde isso não existia. Admito que alguma inveja e despeito possam ter criado essa ideia, que não corresponde de todo à verdade. Não tenho nenhum apetite especial por isso, embora também não tenha nenhum preconceito em relação a isso.

 

O ICAM ainda funciona ou está moribundo?

Apesar de tudo o que se diz do ICAM, tem sido a sorte e o principal veículo da produção e da ficção portuguesa, principalmente cinema. Conheço essa história da lei de televisão há 30 anos: não há nenhuma lei da televisão e cinema que não seja posta em causa, que não suscite críticas. Mas, o que é certo, é que se formos a avaliar o passado do nosso país em termos de produção, devemo-lo a televisão e ao ICAM. Nunca tivemos produtores privados interessados em desenvolver esta indústria. E daí que não faça parta da galeria dos críticos eternos. O ICAM tem tido um papel, com os seus defeitos e erros, importantíssimo na nossa vida pública. Não o vejo como o pior dos instrumentos; vejo-o como fundamental.

 

Não teria sido o escritor que é hoje se não tivesse sido polícia?

É verdade. Posso dizer que as experiências vividas e os olhos com que vi o mundo são outros diferentes do cidadão comum. Obriga-nos a controlar a emoção e, ao mesmo tempo, a distanciar-nos dela. E a ser testemunha dos limites do sofrimento, da tragédia. Esse olhar é decisivo na medida como entendo o outro, a escrita, os leitores.

 

Escrever é, também, uma forma de fazer justiça?

Não, não tenho essa visão justiceira da minha escrita. Preocupo-me com a memória, com o que é importante retermos e sobretudo com o que é importante não esquecermos. Não acerto contas com ninguém, nem com o passado, nem com a vida.

 

O segredo de justiça, em Portugal, é uma espécie de Pai-Natal?

O segredo de justiça em Portugal é muito mal tratado, mas também nunca houve vontade de o tratar bem. Não sendo o pai natal, é um instrumento jurídico que há muito deveria ter sido repensado. Temos o exemplo do caso Madeleine a demonstrar que era preciso repensar todos os mecanismos da sociedade e a forma como as polícias se relacionam com os media. Colaborei na primeira tentativa de o fazer com os “Casos de polícia”, mas não estávamos preparados para isso. Temos ainda uma mentalidade muito corporativista. É preciso coragem para discutir o segredo de justiça porque não faz sentido estar como está.

 

Tendo saído da Polícia Judiciária, como justifica que seja a pessoa mais solicitada para comentar o caso Maddie?

Não sou seguramente. Nos momentos cruciais do caso estive fora. Quando rebentou estava na Grécia, e na segunda vaga de informação estava na Madeira. Só esta semana apareci mais.

 

Mas comentá-lo significa que não consegue desvincular-se do que já foi?

Houve alguém que, de forma muito infeliz, disse que era ridículo um presidente de Câmara comentar isto. Mas eu estou autarca; não sou autarca. É um estado que deixará de existir daqui por uns tempos. Vou continuar ligado aos meus estudos, à minha vida, e não faço intenção nenhuma de ignorar a realidade do ponto de vista do estudo, da avaliação, da medição dos problemas, porque um dia vou voltar à minha vida. Não sou um desses presidentes de Câmara, como temos por aí muitos, que ficam até que as morte os leve. A minha vida é ajudar, investigar. Ser autarca é apenas um contributo de cidadania durante um período da minha vida. Não sou político profissional, nem quero sê-lo. Acompanho estes casos com muita atenção porque são parte do passado mas também do futuro.

 

Está chocado com os títulos que têm saído na imprensa sobre o caso?

A comunicação social inglesa perdeu definitivamente a cabeça. Há ali um ataque de histerismo colectivo que pôs em causa todos os mitos e todos os lugares comuns, nomeadamente o dos jornais ditos de referência. Não são referência de nada, estão comprometidos ideologicamente como os outros. O que se tem dito, sobretudo os jornais ingleses, é uma coisa perfeitamente inacreditável. Sobretudo quando há aqui um paradoxo: sabe-se que a polícia inglesa tem tido uma colaboração e uma dedicação extremas em relação à investigação. Suponho que os próprios polícias não estejam nada satisfeitos com esta mixórdia que tem saído e que não leva a nada a não ser a vender papel. Não informa, não diz a verdade, mente, manipula. Já não me magoa porque já tinha assistido a coisas destas.

 

Posso perguntar-lhe qual é a sua convicção em relação ao desfecho deste caso?

Pode. Mas eu não posso responder.

 

Destronou o PS em Santarém. O PSD é hoje o partido mais próximo da sua família política?

Nunca derrotei o PS. Isso é uma forma de representar o poder local na qual eu não acredito. Uma das instituições que mais precisa de ser revista, e não é apenas com a lei das finanças locais, é o poder local. Está decadente, com grandes dificuldades, completamente amarrado de pés e mãos, não só à partidarite, como a visões excessivamente concentradas e agarradas às visões centralistas. O poder local tem que estar liberto dos aparelhos dos partidos e atento e próximo da região. Isso, na maioria das vezes, é completamente subjugado às estratégias nacionais dos partidos. É doloroso para as populações viver com este estado de espírito.

 

Está desiludido com a vida política portuguesa?

Muito desiludido. Agradeço ter ganho as eleições porque vivi uma experiência única na minha vida, que é ter a capacidade, que nunca tive, de poder ajudar as pessoas de perto. Só o poder local tem esta capacidade. Há injustiças e dramas humanos que nos revoltam, que nos colocam perante um mundo de sofrimentos, de angústias que vão muito para além do que é a retórica formal dos partidos. Portanto, nem o PS perdeu, nem o PSD ganhou. Quem perdeu foi o grupo de pessoas que aqui estava.

 

Quem defenderia para o PSD: Mendes ou Menezes?

O PSD tem que mudar drasticamente. Está a viver uma das maiores crises da sua existência e corre o risco, se não parar, de acabar do tamanho do Bloco de Esquerda. Se o PSD tivesse caído, mas víssemos o CDS ou outro partido subir havia outro tipo de expectativa em relação a mudanças no estado de coisas. Mas isso não se verifica. Nem o PSD consegue responder à política desastrosa deste Governo em relação ao que são os direitos fundamentais das pessoas, como estamos aqui entalados. Aliás, as eleições à Câmara de Lisboa mostram isso na sua plenitude: por mais discursos que haja ninguém consegue mudar a política. A chegada, e mesmo a valentia, de Menezes, que fala e protesta, são saudáveis e interessantes neste confronto. Será com ele que isto vai mudar? Não sei. Mas gosto que tenha assumido essa posição de coerência e maior percepção do problema.

 


publicado por JN às 03:12

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