Fez escala no Porto para apresentar "A Dúvida", peça que partilha com Eunice Munõz. Num intervalo, Diogo Infante, a poucos dias de celebrar 41 anos, metade dos quais em cima do palco, falou da dádiva do teatro. Dessa arte que, abusando do cliché, tem poder para operar mudanças. É o que ele tenta fazer no Teatro Maria Matos, em Lisboa.
Foi o rosto da campanha sobre os malefícios do tabaco. Engordou desde que deixou de fumar?
Dois quilos, se tanto.
E quanto poupou?
Quase 100 euros por mês.
A negação dos ‘prazeres não regimentados’, como escreveu Esteves Cardoso, não o aprisiona?
Um bocadinho, inevitavelmente. Mas é uma questão de equilibrar a balança com outros prazeres.
Como praticar equitação?
Isso não é um prazer; é uma paixão. Estive quase para trazer o Samurai (cavalo) para o Porto. A equitação ajuda-me, disciplina-me e é um momento de libertação: não penso rigorosamente em nada que não seja não cair.
Ainda sobre a campanha antitabágica: alguém lhe disse que parecia um anúncio a um ipod?
Porque ouvia música? [risos] Não. Diz-se muita coisa a meu respeito, mas é pelas costas. Poucos têm coragem de mo dizer na cara.
Porque razão acha que é um bom exemplo para os outros?
Não faço ideia se sou. Há agências que acham isso. Deve ser por ter cara de bom rapaz [risos].
Há um momento em que ser bonito deixa de ter piada?
Não sei. Eu gostei quando começaram a dizer que sou bonito.
Não se achava bonito?
Nunca me tive em especial conta. Só quando comecei a pisar o palco começaram a reconhecer-me essa qualidade. E é preferível ser giro do que ser um coirão.
E ao boato que o associava a José Sócrates, achou piada?
Teve piada da primeira vez. Depois deixou progressivamente de ter piada. Até ao limite de querer dar uma cabeçada em alguém.
Sentiu que a informação funciona como espécie de inquisição?
Não diria inquisição, mas há uma tendência para o julgamento na praça pública, que é perigoso.
Votou PS em 2005?
Não.
Vai votar PS em 2009?
Não.
Se fosse militante do PSD, votaria em quem para a liderança?
Manuela Ferreira Leite. O PSD precisa desesperadamente de uma imagem de credibilidade.
É homem de Direita?
Não, de todo.
Quem dirige o Teatro Maria Matos: o actor com 20 anos de carreira ou um programador imberbe, mas bem intencionado?
Um homem de teatro. Com toda a experiência que isso pressupõe.
Diz querer beliscar consciências. Já se sentiu responsável por sentimentos que provocou?
Claro. Interessa-me que as peças reflictam temáticas com as quais possamos confrontar-nos. Por outro lado, sinto a responsabilidade de estar a gerir dinheiro público.
O serviço público é aborrecido?
Não acho nada. Tem um lado educativo de que gosto. Sinto-me genuinamente feliz por poder estar a dar o meu contributo.
Trouxe agora ao Porto “A Dúvida”, peça em que interpreta um padre acusado de um crime sexual. Arriscaria uma sentença para o caso Casa Pia?
Não me atreveria! É sobre esses juízos a priori que a peça fala e sobre os quais me insurjo, até porque já fui vítima deles.
Acha que as pessoas sentem um prazer sórdido na dúvida?
É o mesmo prazer sórdido que nos faz abrandar o carro numa auto-estrada para ver sangue.
Manoel de Oliveira disse que “o homem inventou o teatro porque teve necessidade de impressionar”. Ainda sente isso?
[Risos] Ainda. Eu era bastante tímido e representar foi o meu grito de Ipiranga. No palco, sei que posso fazer a diferença.
Ainda é um “puto ansioso”?
Ainda sou puto e ainda sou ansioso, mas menos. Sou mais cínico.
Fala sempre desse cinismo com uma naturalidade desarmante...
Porque é um processo natural da vivência. E não é forçosamente mau. Dá-nos espaço para saborearmos as situações de outra forma. Claro que perdemos autenticidade, mas isso não me assusta.
O que faz a diferença entre um talento médio e um inatacável?
Do médio esquecemo-nos com facilidade. O inatacável marca-nos para sempre.
A que grupo pertence?
[risos] Gostaria de de um dia ser um talento inatacável.
Apresentou ‘Cuidado com a língua’, sobre a nossa língua. Concorda com o acordo ortográfico?
Já me fiz essa pergunta. A evolução é natural, mas tenho pena. É como se perdêssemos um bocadinho da nossa identidade.
Aceitaria fazer uma campanha pelo acordo ortográfico?
[Risos] Não.Nem que me pagassem muito bem.